terça-feira, 29 de janeiro de 2013


Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar
os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a mágoa
de me veres eternamente exausto.
No entanto a tua presença é qualquer coisa como 
a luz e a vida
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e
em minha voz a tua voz.
Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados
Para que eu possa levar uma gota de orvalho
nesta terra amaldiçoada
Que ficou sobre a minha carne como uma 
nódoa do passado.
Eu deixarei… tu irás e encostarás a tua face 
em outra face
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás 
para a madrugada
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, 
porque eu fui o grande íntimo da noite
Porque eu encostei minha face na face da noite e
ouvi a tua fala amorosa
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa
suspensos no espaço
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do 
teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos portos silenciosos
Mas eu te possuirei mais que ninguém porque 
poderei partir
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu,
das aves, das estrelas
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente,
a tua voz serenizada.

(Vinícius de Moraes )

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